Durante o carnaval, na casa da odontopediatra Thayse Brandi, uma tradição se repete. Ela e sua filha Valentina, de 8 anos, reservam um tempo para escolher fantasias e se prepararem para os blocos infantis. “Antigamente eu que escolhia. Agora fazemos isso juntas”, conta Thayse, moradora do Rio de Janeiro.
Pelo segundo ano consecutivo, mãe e filha têm um novo folião: Lucca, o caçula da família, com apenas 1 ano e 1 mês, que acompanha a mãe em um sling, uma malha que mantém o bebê seguro junto ao corpo do adulto.
Thayse, que frequentava blocos antes de se tornar mãe, acredita que a participação dos filhos nesses eventos contribui para o seu desenvolvimento. “As crianças aprendem muito através da vivência, não apenas do que é dito para elas. Elas nos veem aproveitando o momento com alegria e descontração, e acho que isso é importante para elas testemunharem”, avalia.
Direito à Diversão
Brincar e se divertir são direitos fundamentais de todas as crianças, conforme estipulado no Artigo 227 da Constituição. O carnaval proporciona um ambiente ideal para exercer esse direito, segundo especialistas.
“É uma expressão cultural, uma festa intergeracional, democrática e coletiva. Os blocos oferecem uma forma de garantir às crianças o direito de participar dessa cultura de forma mais ativa. É um espaço dedicado a elas, onde podem exercer sua liberdade criativa através de fantasias, danças e músicas”, descreve Ana Rosa Moreira, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG).
Blocos Infantis
Para tornar os blocos carnavalescos mais adequados para as crianças, a tradição do carnaval passou por algumas adaptações. Um exemplo é o surgimento dos blocos infantis, como o Largo do Machadinho, Mas Não Largo do Suquinho, que anima parte da zona sul do Rio de Janeiro.
A pedagoga Carla Wendling, fundadora dessa atração, recorda que a ideia surgiu após uma reclamação de sua neta, de 5 anos, sobre a música de um bloco tradicional. “Ela disse ‘vó, que música chata’, porque o bloco tradicional só tocava marchinhas e sambas autorais. Foi assim que surgiu a ideia do bloco infantil”, conta.
O bloco foi criado com um repertório de cantigas de roda ao ritmo de marchinhas, proporcionando uma experiência mais adequada às crianças. “Foi maravilhoso. Além disso, a música contribui para o desenvolvimento, não apenas linguístico, mas também motor e social”, analisa Carla, que foi apoiada pelo cartunista Ziraldo.
Memórias Afetivas
Ana Rosa, que também é psicóloga e membro do conselho da Aliança pela Infância, uma ONG dedicada a promover o direito ao brincar em diversas partes do país e em diferentes classes sociais, enxerga nos blocos infantis uma oportunidade para o desenvolvimento infantil.
“Nos blocos, criamos um ambiente de brincadeira onde as crianças podem expressar sua alegria e participação através do brincar. O ato de brincar é extremamente poderoso como forma de linguagem e de apropriação da cultura, além de ser uma maneira de se relacionar com o mundo”, explica.
Ela destaca que a presença das crianças em eventos como o carnaval não é apenas uma forma de entretenimento, mas também uma oportunidade de aprendizado para a vida. “É um espaço para a criança se apropriar da cultura e aprender valores como respeito, tolerância e troca. É uma experiência formativa”, conclui.
Cuidados e Nutrição
Para garantir que a diversão do carnaval não seja interrompida por contratempos, o pediatra Tadeu Fernando Fernandes, da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), oferece algumas orientações para pais e responsáveis durante os blocos.
“O carnaval é uma época em que devemos redobrar os cuidados para prevenir acidentes com crianças”, alerta. Ele recomenda que as crianças estejam devidamente identificadas, por exemplo, com uma pulseira contendo informações como nome e telefone.
“É uma época de calor, então a alimentação deve ser leve, com sucos naturais, água de coco – apenas para crianças com mais de um ano -, frutas, legumes e verduras. Devemos evitar produtos lácteos, pois podem se deteriorar rapidamente no calor”, explica o presidente do Departamento Científico de Pediatria Ambulatorial da SBP.
Fernando Fernandes também destaca a importância de proteger a pele das crianças com protetor solar e de ficar atento a possíveis acidentes durante brincadeiras. Ele também alerta para o uso de produtos químicos, como sprays de espuma, que podem causar alergias na pele e nos olhos.
Ao levar o pequeno Lucca para os blocos, Thayse toma alguns cuidados extras, como usar algodão nos ouvidos do bebê e evitar locais muito lotados. “Procuro não ficar em lugares extremamente cheios, opto por blocos menores”, relata.
Brincadeira sem Fim
Para Thayse, que valoriza o carnaval como uma celebração que traz leveza à vida, manter essa atmosfera festiva em casa é importante. “Minha filha sempre teve contato com fantasias desde muito nova. Até os 4 anos, ela usava fantasias todos os dias em casa”.
Além disso, o hábito de cantar está presente na rotina da família. “Quase tudo o que fazemos é acompanhado de música, desde as refeições até a hora do banho. Tudo é feito de maneira lúdica”, conta.
Trazer essas experiências para o lar é uma forma de prolongar a alegria do carnaval ao longo do ano. “O carnaval nos deixa mais leves para enfrentar o ano seguinte”, reflete Thay