Em 2023, as mulheres jovens negras, entre 18 e 29 anos, enfrentaram uma taxa de desemprego três vezes superior à dos homens brancos no Brasil. Mesmo quando empregadas, essas jovens negras ganham em média 47% menos que a média nacional e quase três vezes menos que os homens brancos. Além disso, dedicam quase o dobro de horas aos afazeres domésticos em comparação à média de homens negros e brancos.
A análise, conduzida pela organização Ação Educativa com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) de 2023, foi publicada no relatório “Mude com Elas”, divulgado nesta quarta-feira (8).
Uma dessas jovens, Pamela Gama, de 26 anos, compartilhou sua experiência, refletindo os achados da pesquisa. Residente na zona leste de São Paulo, Pamela optou por remover de seu currículo um link para uma rede social de empregos onde sua foto estava visível, com a esperança de receber mais convites para entrevistas.
“Pus o link do meu perfil e depois o removi porque não estava recebendo tantos convites para entrevistas. Então pensei se não seria melhor retirar, entende?”, relatou Pamela, formada em relações públicas, acrescentando que viu uma melhora “um pouco” significativa nas convocações após essa mudança. Pamela trabalha desde os 19 anos e atualmente está empregada em uma empresa na área de comunicação.
Segundo o projeto “Mude com Elas”, em 2023, enquanto as jovens mulheres negras registraram uma taxa de desemprego de 18,3%, os homens brancos tiveram uma taxa de 5,1%. A taxa de desemprego geral no país ao final de 2023 foi de 7,4%.
O salário médio das jovens negras no ano passado foi de apenas R$ 1.582, em comparação com a média nacional de R$ 2.982. Em relação aos homens brancos, a disparidade salarial é ainda mais acentuada. Com uma renda média de R$ 4.270 em 2023, a remuneração desses homens é 2,7 vezes superior à das jovens mulheres negras.
Pamela mencionou conhecer pessoas da mesma idade e com formação semelhante que recebem salários muito mais altos. “Há rapazes, até mesmo alguns conhecidos, que estão na mesma idade que eu e ganham muito mais. Então, sinto essa dificuldade até mesmo de me recolocar no mercado em busca de novas oportunidades”, afirmou.
A informalidade também afeta mais as jovens negras, com apenas 44% delas tendo carteira assinada, uma porcentagem semelhante à dos jovens negros (43,3%). Em contraste, cerca de metade dos jovens brancos, tanto mulheres quanto homens, possuem carteira assinada (50,3% para jovens brancos e 49,8% para jovens brancas).
Além das disparidades salariais e do desemprego, as jovens negras de 14 a 29 anos dedicam, em média, 22 horas semanais aos afazeres domésticos, quase o dobro do tempo dedicado pelos homens negros e brancos, que é de 11,7 horas por semana.
Pamela relatou que ajudou nos afazeres domésticos desde a adolescência e agora, trabalhando em casa enquanto o marido trabalha fora, sente-se sobrecarregada. “Faço o trabalho e tenho que conciliar organizando minha casa. Eu digo que tenho dois empregos”, acrescentou.
O estudo enfatiza a falta de políticas públicas específicas para jovens negras no Brasil, bem como a falta de atenção das empresas para essa questão. O grupo das jovens negras também enfrenta maior dificuldade de acesso ao ensino superior, representando apenas 23,4% do total de jovens na mesma faixa etária frequentando ou concluindo o ensino superior em 2023, em comparação com 39,8% das jovens brancas.
A pesquisadora Andreia Alves, do projeto “Mude com Elas”, destacou que, embora exista uma cultura que tende a colocar jovens em situações precárias no mercado de trabalho, a situação piora significativamente quando se considera raça e gênero.
“Evidenciamos frequentemente mulheres jovens negras ocupando os espaços mais precários, com os piores cargos, o que é diferente para pessoas não negras”, ressaltou Andreia Alves. Ela acrescentou que essa disparidade tem raízes históricas, remontando ao período escravocrata, quando as jovens mulheres negras eram frequentemente destinadas ao trabalho doméstico.
“Essas mulheres frequentemente moram em locais distantes dos locais de trabalho, o que as obriga a assumir responsabilidades domésticas desde cedo”, concluiu Alves. Ela enfatizou a importância de ouvir essas jovens ao desenvolver políticas para minimizar essa desigualdade no mercado de trabalho, e observou que, apesar do aumento na educação formal das mulheres negras nos últimos anos, isso não se traduziu em uma maior presença no mercado de trabalho, especialmente em cargos de liderança.