Há mais de 40 anos, o ambientalista Nereu Rios dedica-se integralmente à coleta de sementes, produção de mudas e à observação das árvores que fornecerão mais matéria-prima para reiniciar o ciclo. Contudo, nos últimos anos, essa rotina tem se tornado desafiadora à medida que ele percebe a crescente dificuldade em multiplicar algumas espécies.
“No Mato Grosso do Sul, há uns dez anos venho coletando amostras de pau-ferro [Libidibia ferrea] que dão a vagem, mas não a semente”, relata Nereu. Nascido em Dourados (MS) e atualmente residindo em Campo Grande (MS), ele divide seu tempo entre o viveiro onde trabalha e suas expedições pelo Cerrado, observando de perto a diversidade resultante de seu trabalho. Além da dificuldade em obter sementes, ele também nota mudanças significativas na paisagem.
“Passando por Olhos D’Água, próximo a Alexânia (GO), eu mostrava para meu filho os ipês-roxos [Handroanthus impetiginosus] que coletávamos há uns oito anos. Agora, eles estão morrendo porque a monocultura tomou conta da estrada e a pulverização do milharal está matando tudo ao redor”, destaca.
André Andrade, pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), explica que para produzir sementes, a planta necessita de muita energia, obtida pela fotossíntese, que requer água e luz solar abundantes. Com a mudança climática, o ciclo natural sofre perturbações. “Durante longos períodos de estiagem, combinados com anos de El Niño, há muito sol, mas falta água. A planta, então, interrompe a fotossíntese para sobreviver, impedindo a produção de energia necessária para gerar sementes”, explica Andrade.
A ONU reforça essa preocupação, destacando o enfrentamento à desertificação e a construção de resiliência à seca como temas centrais do Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado em 5 de junho. A campanha deste ano enfatiza: “Não podemos retroceder no tempo, mas podemos restaurar florestas, restabelecer recursos hídricos e recuperar o solo. Somos a geração que pode reconciliar-se com a terra”.
Desertificação e Degradação do Solo
Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), bilhões de hectares de terra estão degradados globalmente, contribuindo para a desertificação e a seca, afetando metade da população mundial. Esse fenômeno ameaça comunidades rurais, pequenos agricultores e coloca em risco metade do Produto Interno Bruto (PIB) global, podendo gerar insegurança alimentar.
Andrade ressalta a importância da restauração de ecossistemas como a solução mais rápida e eficaz para equilibrar os ciclos da água e do carbono, prevenindo o agravamento do aquecimento global e de eventos climáticos extremos. “Restaurar grandes áreas agora, em 20 a 30 anos, é uma estratégia viável para alcançar a transição energética necessária, pois existe um limite para o carbono que as florestas podem armazenar. Precisamos agir antes que esse limite seja atingido”, conclui.
Missão de Vida
Nereu Rios, familiarizado com o Cerrado desde a juventude, cresceu em uma família de moveleiros nas proximidades do arco do desmatamento. Porém, a convivência com a terra fez com que ele admirasse mais uma árvore florida do que a madeira derrubada. Em sua “missão de vida”, ele aprendeu que as escolhas individuais impactam o clima, a vegetação e até os insetos, que em um ambiente desequilibrado, se tornam pragas.
“Sei que existe um inseto que consome a seiva na vagem do pau-ferro, impedindo o desenvolvimento da semente, mas esse não é o único problema. Há quatro anos não consigo coletar sementes de angelim-amargo [Andira anthelmia], uma espécie que antes era abundante, assim como a guavira [Campomanesia adamantium], que no ano passado produziu muito pouco. Plantas que antes produziam anualmente, agora produzem irregularmente, às vezes ficando dois ou três anos sem gerar sementes”, relata Nereu.