A recente ampliação do BRICS, definida na 16ª cúpula realizada em Kazan, Rússia, marca uma transformação significativa para o bloco. Com a inclusão de novos países, como Irã, Egito, Emirados Árabes Unidos e Etiópia, e o anúncio de outros 13 possíveis membros, a organização expande seu alcance e reafirma o desejo de reformular as dinâmicas de poder globais. Segundo especialistas, o Brasil conseguiu fortalecer sua posição ao assegurar um novo mandato de liderança no banco do BRICS, o que contribui para ampliar o peso geopolítico do país.
Para a professora Maria Elena Rodríguez, coordenadora de estudos sobre o BRICS na PUC-Rio, a cúpula representou mais que um evento protocolar, expondo o sentimento de insatisfação com o sistema de governança global atual. “Esse encontro trouxe uma voz coletiva que reflete a necessidade de mudanças, especialmente com relação à subrepresentação de países emergentes nas decisões internacionais. A presença do secretário-geral da ONU, António Guterres, reforça o prestígio do bloco e sinaliza sua crescente relevância no cenário global”, aponta.
Alternativa para o Sul Global e diversidade de regimes
O BRICS vem se consolidando como uma alternativa para os países do Sul Global, os quais, em geral, encontram-se subrepresentados nos órgãos internacionais dominados por potências ocidentais. Fabiano Mielniczuk, professor de ciência política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), afirma que o bloco oferece uma estrutura de cooperação econômica e política, independente do modelo liberal estabelecido por Bretton Woods. “O BRICS representa uma plataforma onde diferentes regimes podem cooperar sem seguir os padrões ocidentais, refletindo a pluralidade de sistemas de governo e economias”, explica. Para ele, a diversidade de regimes entre os membros fortalece o grupo, que é agora visto como um espaço de diálogo, inclusive para nações em conflito, como China e Índia.
Reconhecimento do protagonismo brasileiro
A extensão do mandato de Dilma Rousseff à frente do Banco do BRICS foi outro destaque da cúpula, refletindo a relevância do Brasil dentro da organização. Mielniczuk observa que esta conquista resulta de uma atuação diplomática eficaz do país, orientada por Lula, que defende a redução da dependência do dólar nas transações globais. Além disso, a liderança brasileira no BRICS em 2025 coloca o país em uma posição estratégica para direcionar as políticas do grupo, como o uso de moedas locais em transações comerciais e o desenvolvimento de uma plataforma interbancária unificada.
Efeito estabilizador e resposta à pressão internacional
A cúpula de Kazan também sublinhou o papel do BRICS como força estabilizadora no atual panorama geopolítico. Segundo Rodríguez, a reunião não pode ser interpretada como um “triunfo russo”, mesmo com a Rússia sendo a anfitriã durante o conflito na Ucrânia. “O evento mostrou o peso do bloco como um todo, e não como um instrumento exclusivo de um único país”, comenta. Em sua análise, a cúpula consolidou o BRICS como uma organização com voz própria, que tende a atuar como mediadora de tensões, fornecendo um fórum para o diálogo e a cooperação.
Com o avanço no uso de moedas locais e o fortalecimento de plataformas financeiras próprias, o BRICS emerge não só como um bloco econômico, mas como uma coalizão que visa remodelar a ordem mundial com base nos interesses dos países emergentes.