Mais de 100 mil mulheres brasileiras provenientes de áreas rurais, florestais, aquáticas e urbanas, bem como representantes de 33 nações, estão previstas para comparecer em Brasília nesta terça-feira (15) e quarta-feira, participando da 7ª edição da Marcha das Margaridas. Este evento bienal, organizado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), suas federações e sindicatos afiliados, juntamente com 16 organizações parceiras, assume um papel significativo no cenário político. Ocorrendo a cada quatro anos, a edição de 2023 adota o lema “Pela Reconstrução do Brasil e Pelo Bem Viver”.
Entre as participantes, destacam-se trabalhadoras rurais, indígenas, quilombolas, ribeirinhas, sem-terra, extrativistas, membros da comunidade LGBTQIA+ e residentes de áreas urbanas. De acordo com a Contag, essa marcha é considerada a maior manifestação política liderada por mulheres na América Latina.
Pautas
As principais demandas reivindicadas este ano pelas “margaridas” estão divididas em 13 eixos políticos que serão debatidos nos dois dias do evento:
Democracia participativa e soberania popular;
Poder e participação política das mulheres;
Vida livre de todas as formas de violência, sem racismo e sem sexismo;
Autonomia e liberdade das mulheres sobre o seu corpo e a sua sexualidade;
Proteção da natureza com justiça ambiental e climática;
Autodeterminação dos povos, com soberania alimentar, hídrica e energética;
Democratização do acesso à terra e garantia dos direitos territoriais e dos maretórios;
Direito de acesso e uso da biodiversidade, defesa dos bens comuns;
Vida saudável com agroecologia e segurança alimentar e nutricional;
Autonomia econômica, inclusão produtiva, trabalho e renda;
Saúde, Previdência e Assistência Social pública, universal e solidária;
Educação Pública não sexista e antirracista e direito à educação do e no campo;
Universalização do acesso à internet e inclusão digital.
Mazé Morais, natural do Piauí e coordenadora-geral da Marcha das Margaridas, assim como secretária de Mulheres da Contag, compartilhou suas perspectivas sobre a marcha em uma entrevista. Ela discutiu a expectativa em torno do evento e a pauta que foi desenvolvida durante várias reuniões realizadas em todo o país desde 2021.
Ela mencionou: “Trabalhamos arduamente na construção de uma agenda e a entregamos ao governo federal em 21 de junho. Esperamos por uma abordagem comprometida com os interesses do campo popular democrático. Nossa esperança é que, durante a cerimônia de encerramento da marcha, as autoridades possam efetivamente anunciar medidas significativas relacionadas às políticas públicas, programas e espaços relevantes. Desejamos que essas medidas tenham um impacto real na vida das mulheres, abrangendo todos os territórios do Brasil.”
Conquistas
“Essa é a marcha da esperança, porque estamos muito confiantes quanto à retomada dos programas, das políticas, conquistas, que ao longo do caminhar de muita luta, nós, as margaridas, conquistamos. Infelizmente, muitas delas foram retiradas, extintas. Então, há uma expectativa muito grande de que vai ser uma grandiosa marcha, com a representatividade linda da diversidade que somos todas nós”.
A ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, disse que nos últimos meses a pasta trabalhou em parceria com outros ministérios para garantir respostas às diversas reivindicações das margaridas. “Desde ações de enfrentamento à violência contra as mulheres e garantia da autonomia econômica, à proteção dos biomas e justiça climática, por exemplo”.
“Hoje, temos um governo que respeita as mulheres do campo, da floresta e das águas e que tem a participação social como eixo fundamental na construção e implementação de políticas públicas. Então, a Marcha das Margaridas é essa força que move estruturas e que impulsiona o Brasil rumo ao desenvolvimento sustentável, ao bem viver”.
Inspiração
Desde o ano 2000, a Marcha das Margaridas recebe o nome em homenagem a Margarida Maria Alves, ex-presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande, localizado na Paraíba. Margarida Maria Alves foi brutalmente assassinada em 12 de agosto de 1983 devido à sua incansável luta pelos direitos dos trabalhadores rurais. Desde então, sua liderança se tornou um símbolo de resistência para inúmeras pessoas, homens e mulheres, que buscam justiça e dignidade. Os latifundiários da região são apontados como suspeitos do homicídio. No entanto, até hoje, o crime permanece sem solução e os responsáveis não foram devidamente condenados.
O caso de Margarida Maria Alves chamou a atenção da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), tornando-se um marco na denúncia das violações sistemáticas dos direitos fundamentais. Em abril de 2020, a comissão publicou o Relatório de Mérito 31/20 sobre o caso, concluindo que o Estado brasileiro é responsável pela violação dos direitos à vida, integridade pessoal, proteção e garantias judiciais de Margarida Alves e das pessoas mencionadas no relatório internacional. O relatório também ofereceu recomendações ao Estado brasileiro, visando reparar integralmente os familiares da vítima, conduzir uma investigação eficaz para esclarecer os fatos e fortalecer o Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos, com foco na prevenção de atos de violência.
Quatro décadas após o trágico assassinato da paraibana, a secretária Mazé Morais continua a defender a memória da sindicalista que se dedicou incansavelmente aos trabalhadores do campo. Ela ressalta: “Margarida sempre será nossa fonte de inspiração, e é por essa razão que continuamos marchando.”