A presidente da Comissão de Anistia, Ana Maria Oliveira, afirmou que os réus no Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de Estado e pelos ataques aos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023 deturpam o conceito de anistia ao pedirem “perdão pelos crimes cometidos”. Segundo ela, anistia não equivale a impunidade, mas sim ao reconhecimento de perseguições promovidas pelo Estado em regimes autoritários.
“Anistia é um outro conceito. É o que o Estado brasileiro está fazendo contra aqueles que foram perseguidos pelo Estado ditatorial”, destacou Ana Maria em entrevista à Agência Brasil. Procuradora aposentada e integrante da comissão desde 2004, ela enfatizou que a falta de responsabilização por crimes cometidos durante a ditadura militar contribuiu para que atos recentes contra a democracia ocorressem sem receio de punição.
A Comissão de Anistia é um órgão vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania e tem atuado para reforçar a memória histórica e garantir que crimes do passado não sejam esquecidos. “Precisamos que o STF não acoberte com o manto da anistia os torturadores da ditadura. A lei de 1979 não é uma lei de anistia para torturadores, mas sim de memória”, explicou.
Diferença entre anistia e impunidade
Para Ana Maria Oliveira, as propostas no Congresso Nacional que defendem anistia para os envolvidos nos atos de 8 de janeiro são uma distorção do conceito. “O que está sendo pedido no Congresso Nacional não é anistia. O que está sendo pedido é perdão pelos crimes cometidos por aqueles que atentaram contra a democracia”, afirmou.
Segundo a presidente da comissão, anistia se aplica a casos em que indivíduos foram perseguidos pelo Estado de maneira ilegítima, o que não se enquadra na situação dos réus pelos ataques de janeiro de 2023. “Eles estão sendo julgados dentro do Estado Democrático de Direito, com todos os seus direitos assegurados”, reforçou.
A falta de punição de agentes da ditadura, como o coronel Carlos Brilhante Ustra e o delegado Sérgio Fleury, criou um ambiente de impunidade que, para Oliveira, incentivou atos recentes contra a democracia. “Como não houve responsabilização no passado, agora eles acham que também podem ser anistiados ou perdoados pelo que fizeram”, declarou.
Memória e educação para evitar repetição do passado
A Comissão de Anistia tem se dedicado a iniciativas que reforcem a memória histórica e eduquem novas gerações sobre as consequências da ditadura militar e de outros ataques à democracia. A produção cultural, como o filme Ainda Estou Aqui, sobre Eunice Paiva e sua luta por justiça, tem sido destacada como uma ferramenta importante nesse processo.
“Precisamos continuar a trabalhar e contar para o Brasil e para o mundo o que ocorreu na ditadura. O resultado da não responsabilização dos torturadores foi o 8 de janeiro”, alertou. Entre as iniciativas planejadas pela comissão estão a retomada das Caravanas da Anistia e o projeto Marcas da Memória, que visa rebatizar locais que ainda carregam nomes de torturadores.
Por fim, Ana Maria Oliveira reiterou a necessidade de o Estado brasileiro intensificar seus esforços para devolver às famílias os restos mortais de vítimas da ditadura e garantir que a história do país seja preservada. “Estamos a 61 anos do golpe e até agora praticamente ninguém foi responsabilizado. É preciso que o Estado se empenhe”, concluiu.