Entidades que representam as vítimas do rompimento da barragem de Fundão, operada pela Samarco, protocolaram no Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação pedindo a revisão de cláusulas do novo acordo de reparação. O documento, que totaliza mais de 1.300 páginas, foi apresentado às vítimas apenas no dia da assinatura, fato que gerou indignação nas entidades Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e Associação Nacional dos Atingidos por Barragens (Anab). Elas pedem a suspensão de pontos específicos do Programa de Indenização Definitiva (PID), além da criação de um comitê fiscalizador para garantir o cumprimento dos direitos dos atingidos.
A tragédia completa nove anos, e as entidades afirmam que os atingidos foram excluídos do processo de repactuação. Segundo a ação, a Lei Federal 14.755/2023, que institui a Política Nacional de Atingidos por Barragens (PNAB), garante a essas pessoas o direito à escolha informada sobre alternativas de reparação. Apesar disso, o acordo, assinado em outubro pela Samarco, Vale, BHP Billiton, governos estaduais e federal, e instituições de Justiça, teria ignorado o direito de participação dos afetados, violando dispositivos tanto da PNAB quanto da Política Estadual de Atingidos por Barragens de Minas Gerais (PEAB).
Mudanças e Controvérsias no Novo Acordo
O novo acordo, que substitui o Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) de 2016, prevê a extinção da Fundação Renova e a criação de um novo modelo de governança. A Samarco assumiu o compromisso de desembolsar R$ 100 bilhões ao longo de 20 anos, além de R$ 32 bilhões em medidas reparatórias. No entanto, o PID, que é uma das novidades, está entre os pontos mais criticados. Esse programa oferece indenizações de R$ 35 mil para vítimas em geral e de R$ 95 mil para pescadores e agricultores, valores que, segundo o MAB, estão abaixo do necessário.
Outro ponto de controvérsia é a exigência de documentos específicos, como o Registro Geral de Pesca (RGP) e o Cadastro Nacional da Agricultura Familiar (CAF), o que, segundo as entidades, pode excluir agricultores e pescadores informais. Além disso, a exigência de assinatura de um termo de quitação final foi questionada por forçar as vítimas a escolherem entre a indenização pelo PID ou buscar reparação na Justiça inglesa contra a BHP Billiton, sócia da Samarco.
Reconhecimento das Comunidades e Inclusão de Municípios Baianos
A ação também reivindica que o acordo inclua comunidades tradicionais e indígenas, assim como municípios do sul da Bahia que sofreram com a chegada da lama. De acordo com as entidades, o acordo ignora a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que garante a consulta prévia e informada a povos tradicionais em situações que afetem seus direitos diretamente.
Esperança de Decisão do STF
O STF ainda precisa homologar o novo acordo, e as entidades pedem que isso seja feito somente após a escuta dos atingidos. Elas solicitam que o tribunal institua um Programa de Direitos das Populações Atingidas por Barragens, financiado pelas mineradoras e fiscalizado por um comitê tripartite composto por representantes do governo, empresas e sociedade civil.
A questão permanece em aberto, e o governo brasileiro, por meio da Defensoria Pública da União, pretende ajudar as vítimas a tomarem uma decisão informada, oferecendo alternativas ao PID e permitindo que elas escolham entre a indenização imediata ou a possibilidade de esperar o julgamento da ação no Reino Unido, onde a condenação da BHP Billiton pode atingir valores superiores aos propostos pelo acordo no Brasil.